quinta-feira, 5 de julho de 2012

Tons Multicoloridos


- Eu acho que assim está melhor – falou André ao ajeitar a mecha de cabelo da modelo – é só você colocar o rosto um pouco mais para a esquerda que o click ficará perfeito!
Era uma tarde qualquer e nevava bastante. O estúdio de André era grande, fazia parte de um dos quartos do seu apartamento. As janelas eram enormes, cobrindo toda a extensão da parede. A rua, a neve caindo, as luzes translúcidas por conta do inverno, tudo parecia maior, mais bonito, mais mágico.
Mágico era o momento. André deliciava-se com a profissão de fotógrafo. André havia lutado muito para chegar onde estava, começou como ajudante de um fotógrafo e foi aprendendo a manusear a câmera. No início era complicado aprender a ver as luzes. A luz é algo encantador, mas, manuseá-la é complicado. André preferia fotos coloridas, com muita vida, cores quentes, porém, odiava a tal da pós-produção. Fazia de tudo para as fotos saíssem perfeitas no momento do click e, pronto!
O pensamento voava longe, ele manuseava a máquina, controlava o ISO, a velocidade do obturador, a abertura do diafragma, equilíbrio do branco. A iluminação em cima da modelo já estava perfeita. André passeava pelo seu trabalho, até a modelo interromper:
- André, e aí? Não ouvi você tirando nenhuma foto desde que ajeitou meu cabelo, isso faz quase dez minutos! – Anna falou um tanto irritada, permitindo que André percebesse o tom de sua voz, um descuido – Sabe, tenho coisas para fazer ainda hoje, e você não me pagou adiantado.
- Anna, pelo seu tom, você está de TPM, a culpa não é minha, e o seu dinheiro está guardado – André desarmou Anna, revelou sua TPM e falou do pagamento, agora a modelo ia esperar os clicks e André faria seu trabalho em paz.
Anna era jovem, tinha dezenove anos e pretendia subir na carreira, precisava ajudar sua família, moravam no subúrbio. Desde pequena era muito bonita e chamava a atenção por onde passava. Logo aos quinze anos foi convidada para participar de algumas propagandas de produtos pequenos. Perfumes, loções para banho, hidratantes. Fez fotos no parque, praças, teatros, e no chuveiro. Nunca quis posar nua. Aos dezoito anos Anna montou uma teoria: o subúrbio era o lugar de mulheres bonitas, majestosas, lindas e com sex appeal. Aos dezenove, sabia que tinha que deslanchar como modelo, e soube do trabalho de André. Ele era um fotógrafo renomado, tinha batalhado muito para chegar onde estava, e tinha apenas trinta anos.
Era final do ano e a neve caía intensa. Logo chegaria o natal e Anna teria que gastar muito ajudando na festa da família. Ela inda não havia conseguido juntar o dinheiro que queria para viajar para a França, queria poder viajar um pouco, visitar alguns países e conhecer pessoas diferentes. Olhou para André, depois de algumas fotos e perguntou:
- Quando você pretende terminar isso? O frio está aumentando, e eu estou sem roupa! – Isso mesmo, Anna decidiu confiar no projeto de André, fotos de nudez. Não eram fotos normais. André não estava preocupado com “as partes”, muito menos uma modelo contorcionista – Sabe, desculpa por reclamar tanto, você sabe é a TPM. Queria dizer que gostei da sua ideia de trabalhar com nudez e perspectiva de espelhos e uso de cristais para criar arco-íris verdadeiros, sem precisar de uso de computadores. Até então nunca tinha posado nua.
- Percebi pelo seu nervosismo quando lhe expliquei a ideia, mas, eu também não queria modelos experientes com fotos de nudez. Estou tentando capturar suas expressões desconfortáveis com a sensação, ocorrência inicial, depois o costume vai deixando as preocupações de lado, e aí as cores aparecem. De uns tempos para cá venho querendo identificar as expressões corporais como cores misturadas, formando intensos compostos de tonalidades e sentidos, sentimentos – André explica sua teoria e percebe o rosto interessado de Anna.
- Então o cristal por onde passa esse simples lampejo é uma metáfora para o costume adquirido? A partir daí as coisas podem se soltar e criar cores, múltiplas cores a depender do dia, da hora, do momento, do sentimento – Anna estava com o rosto enrugado, estava pensando, percebeu que André aproveitou o momento para fazer alguns clicks – Ei! Eu fico feia quando estou pensando!
- (risos) não fica não, seu rosto tem traços que lembra o vermelho, um vermelho no tom certo, aquele que desperta a paixão, mas, sem ser forte e nem chegado à rosa. E seus olhos azuis, grandes olhos intensamente azuis, dão o contraste – André falou sem pensar, não queria aparentar um sedutor qualquer, o elogio escapou de sua boca.
- Obrigado – Anna respondeu embaraçada e envergonhada, não estava acostumada com elogios, André continuou com os clicks – Agora devo ter ficado mais vermelha e você aproveitou.
Os dois sorriram bastante e conversaram. Quanto mais a conversa fluía, mais André via Anna como um belo arco-íris, dos que merecem ser guardados. As fotos estavam fazendo seu papel, registrando a beleza. Nas fotos Anna aparecia com suas expressões e na medida em que André mudava de posição para fazer os clicks a luz do arco-íris projetada pelo cristal modificava as tonalidade. As fotos estavam ficando perfeitas.
André decidiu dar alguns zooms nos seios de Anna, eles eram médios em formato de gota, mamilos rosados e com a pele clara. André gostou do tom rosado, escolheu uma posição em que o arco-íris do cristal permitisse um tom que destacasse os mamilos. Anna era clara, não muito branca, nem puxando para um tom amarelado, era clara. André soube aproveitar muito bem o tom de pele da Anna, quando tirou algumas fotos com a janela e todo o nevoeiro por trás de Anna.
A conversa estava ficando mais agradável com o tempo. O ensaio terminou e Anna foi se vestir e percebeu que suas roupas não dariam conta daquele frio lá fora, mas ela tinha que sair o quanto antes. André ofereceu um café quente. Era sua especialidade, ele sabia a temperatura certa da água, a quantidade certa de pó de café, o pó mais saboroso. Enfim, o café saiu cremoso e saboroso como sempre. Anna esquentou-se um pouco mais com o café, eles conversaram mais um pouco e André decidiu mostrar as fotos que tirou de Anna.
Era estranho, pois Anna nunca tinha se visto daquele jeito, parecia que sua beleza tinha se multiplicado. Suas pernas estavam com tons que ela nunca tinha visto, suas curvas eram avermelhadas e sensuais. Seu rosto estava com contrastes belíssimos, e seus olhos realmente faziam a diferença. Até que chegou ao crime, seus seios estavam em destaque, ficou extremamente envergonhada, pois, André estava ao seu lado. Olhou para ele, mas os olhos de André estavam vidrados na fotografia e parecia apreciar atentamente os detalhes. Ela já desconfiava, era aquele tom rosado, era um tom diferente, sedutor, que de tão suave era capaz de inflamar desejos quentes. A cozinha do estúdio parecia multicolorida, André e Anna estavam esbanjando sensações.
- Seu olhar é impressionante! – disse Anna ouvindo André responder: seu corpo é multicolorido.
Anna não voltou para casa, a neve não iria deixar de qualquer jeito. Os dois, naquele estúdio, alí no chão mesmo, transformaram em cores o que através da janela era o branco da neve.

(Y.S.S)